Capítulo 10 da Série "A Niterói que eu vi e a que viram meus avós", de Romeu de Seixas Mattos

Do vasto cenário de vários acontecimentos históricos, de pleitos judiciários, de atos de prepotência, de benevolência e altruísmo, que foram narrados em outros trabalhos, resta-nos tratar dos remanescentes do Campo de Dona Helena (terreno que se alongava do atual Rinque à Rua da Conceição) onde, além dos terrenos que foram absorvidos pelas ruas e caminhos traçados dentro do seu perímetro, projetaram duas praças com o objetivo de comemorar a instalação do Pelourinho, em 11 de agosto de 1819, e um passeio público alusivo à memória da visita de D. João VI e desfile das tropas lusitanas em maio de 1816.

Assim sendo, vamos tratar aqui da "Praça Santo Alexandre", deixando para outra vez, o Largo da Memória (atual Rinque).

Sanadas as dificuldades que mantiveram o local em evidência, a Praça Santo Alexandre foi devidamente traçada, construído em todo o seu perímetro um passeio de lajes de pedra, feito um calçamento de alvenaria bruta nas ruas que contornavam, ficando o centro em terra batida, onde crescia vegetação rasteira, um capim ralo que de tempos em tempos precisava ser capinado, situação que encontrei em 1903, quando voltei a residir em Niterói, e perdurou até 1909, o que me leva a crer ter advindo daí a origem do nome popular de "Largo do Capim, onde montaram "circos de cavalinhos", a cujos espetáculos a garotada do meu tempo assistia em pagar ingresso sempre que conseguia furar o pano de lona.

Para evitar esses abusos, havia em torno do circo uma cerca de arame farpado e um fiscal para garantir a eficiência dessa medida, mesmo assim ocorrendo burlas e sendo "furada a lona", vez por outra.

Em tempos idos, isto é, logo após a ereção do Pelourinho, esse logradouro era chamado pelo povo de "Largo do Pelourinho", e assim se lhe referiam as autoridades governamentais na lei de desapropriação de 30 de outubro de 1845, assinada pelo Presidente da Província Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho. Contudo nenhum desses nomes permaneceu porque, com o advento da República, foi dado a essa praça, o nome de "Floriano Peixoto" e, atualmente, mudaram para o de Acadêmico Walter Gonçalves".

Baseado na Deliberação nº 77, art. 1º, de 21 de janeiro de 1907, o Prefeito Municipal Dr. João Pereira Ferraz contraiu empréstimo de cinco mil contos de réis (autorizado pela Deliberação nº 78 de 26 de agosto de 1807) e ordenou à Diretoria de Obras que publicasse o Edital de Concorrência para apresentação de projeto do novo edifício da Prefeitura, de acordo com o programa organizado pela referida Diretoria.

Publicados os editais em fevereiro de 1908 e encerrada a concorrência em 31 de março do mesmo ano, foi aceito o projeto do Engenheiro Carlos Rossi, o qual recebeu o prêmio de dois contos de réis que lhe foi concedido pela Portaria n. 80, de 21 de setembro de 1908.

Na concorrência para a construção foi escolhida a proposta dos Construtores Di Piero Primavera & Comp. e com eles firmado contrato em 3 de março de 1909, pelo preço de 382:140$140. Os reflexos dessas providências incidiam no destino da Praça Santo Alexandre.

Tenho vaga lembrança de haver assistido ao lançamento da "pedra fundamental" do edifício da Prefeitura Municipal de Niterói, mas não posso precisar o dia em que isto ocorreu. Recordo-me de que, dias depois dessa solenidade, estava assistindo à Sessão da Câmara Municipal quando o Vereador Dr. Luís Carlos Fróes da Cruz, em discurso violento, atacou o Prefeito por ter ocupado, com sem licença da Câmara, a Praça Santo Alexandre com a construção do edifício da Prefeitura Municipal, sendo o Prefeito defendido pelo Vereador Dr. Carvalho e Mello; não me lembro, porém, do resultado dessa discussão.

Segundo penso, até o final da construção do edifício, havia o intuito de fazer funcionar, como até então, a prefeitura e a Câmara no mesmo prédio.

Terminada a construção, a 4 do agosto de 1910, parece-me que o edifício não foi inaugurado com solenidade, pois havia nessa época uma luta política muito séria; por isso, talvez, as repartições municipais para ele se transferiram parceladamente, continuando a Câmara Municipal no antigo prédio, em frente ao Jardim Pinto Lima (Praça D. Pedro II), até que mais tarde foi construído seu atual edifício, por volta de 1913, no mesmo local do prédio anterior, projeto do arquiteto Roberto Micka (salvo engano), já na administração do Prefeito Dr. Feliciano Pires de Abreu Sodré Júnior.

No Paço Municipal existia, no término do primeiro lance de escada de subida para o pavimento superior, uma artística placa de bronze com os seguintes dizeres: "Edifício mandado construir pela Prefeitura no ano de 1900, sendo presidente do Estado o Ex-mo Snr. Dr. Alfredo Backer e prefeito o Eng.ro Civil Dr. João Pereira Ferraz.

Essa placa ostentava, na parte superior (mais estreita que a inferior) as armas do Estado do Rio de Janeiro ladeadas por dois golfinhos que compunham a diferença de dimensões entre as duas portas, e na parte inferior, um outro escudo com Caduceu de Mercúrio no alto, outras alegorias de flechas etc, no centro e na parte baixa.

Em 1927, na administração do Dr. Vilanova Machado, o prédio da P.M.N. foi remodelado, encarregando-se das obras o General Júlio César de Noronha, que possuía uma firma particular de construção civil nessa época.

Nessa remodelação de 1927, foi modificado o torreão do prédio e dele retirado o relógio que aí existia, tiradas as divisões que formavam os pequenos gabinetes para transformá-los em amplos salões.

Nessa mesma ocasião da reforma de 1927 foi também removida a primitiva placa de construção do edifício, colocada pelo Dr. João Pereira Ferraz, do local onde se achava, no patamar da escada, para o Salão de Espera no Gabinete do Prefeito, local onde ainda deve estar.

No lugar da antiga placa, isto é, no patamar da escada de subida, foi colocado um medalhão com a efígie do Dr. Vilanova Machado, tendo abaixo uma outra placa de bronze, com dizeres referentes à remodelação do prédio.

O relógio foi retirado do torreão porque, tanto o antigo como o atual, era de difícil acesso para dar corda ao relógio, era preciso colocar uma pesada escada da madeira a fim de alcançar o torreão, entrando-se por uma pequena escotilha, razão pela qual o relógio estar quase sempre parado.

Naquela época já existiam alguns empregados que, por influência política, recebiam ordenados sem trabalhar, por isso sendo designados: "do Grupo do Relógio"

Mais tarde, não existindo mais o relógio, esse pessoal era conhecido como "Batalhão 180": com o aumento do custo de vida e aumento do salário mínimo, o Batalhão passou a "450".

Após o advento da Revolução de 1930, os costumes modificaram-se, pessoal protegido da política não foi mais incluindo em folhas de pagamento de diaristas, com salário mínimo, sem garantias, passando a penetrar nos quadros de funcionalismo pela cúpula, em cargo isolados e de livre escolha e nomeação, sendo chamados por isso "Os Paraquedistas".

Agora, afastado há muito tempo da vida pública, não sei como se faz para conseguir "furar o pano" entrar no circo sem pagar entrada, nem como se burla o sistema do mérito no serviço público.

Outras modificações e ampliações foram feitas no edifício sede dos serviços municipais, mas se verificaram em ocasiões em que, pelas circunstâncias do momento, a sede das minhas atividades não se concentrava nesse edifício.

Publicado originalmente em O Fluminense, em 10 de maio de 1974
Pesquisa e Edição: Alexandre Porto


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Publicado em 18/09/2024

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